É comum falarmos de design e da morte, mas raramente os dois termos são colocados em uma mesma frase ou contexto. O primeiro toca todas as partes das nossas vidas. Já o segundo é um tema que causa medo, desconforto e que muitos preferem evitar. Mas, em uma época em que repensamos nossos hábitos e tratamos de bem estar, sustentabilidade, qualidade de vida e nossa existência na era digital, por que não repensar também nossa relação com a morte?
Parando para analisar, nossos rituais funerários são os mesmos há muito tempo. E, de acordo com alguns especialistas e seus estudos, essa condição não é mais suficiente na atualidade. Mas, para falar desse tema, é preciso antes dar um passo atrás e olhar ao nosso redor.
A morte muitas vezes está relacionada a uma doença. Para Ana Claudia Quintana Arantes, médica de cuidado paliativo e autora do livro A Morte é um Dia Que Vale a Pena Viver, a doença é “uma abstração da realidade. Ela está nos livros, ela está no microscópio, nas definições, nas publicações. Mas, quando a doença encontra um ser humano, ela produz uma melodia única, que se chama sofrimento. As doenças se repetem nas pessoas, mas o sofrimento não. O sofrimento é único – cada um tem o seu”.
Os livros de cuidado paliativo, como diz em seu
É justamente desse “buraco” que os projetos abaixo tratam. Por meio do design (e da arquitetura), eles buscam confortar e trazer mais normalidade a todos – doentes, idosos, familiares e amigos.
Desconstruindo e descontraindo a morte
A
Alguns projetos similares são o
A tecnologia em relação à morte
No lado tecnológico, um recurso como o inventado por Tony Stark em Vingadores: Ultimato seria um sonho para muitas pessoas. No filme, o Homem de Ferro deixa um holograma gravado para sua família. Quem não gostaria de poder ouvir a voz, e ver um ente querido ou amigo quantas vezes quiser?
Na vida real, já existem iniciativas como o aplicativo
Desmistificando
Para a designer de serviço finlandesa Marja Kuronen, o primeiro passo para melhorar nossa relação com a morte é desmistificá-la, trazê-la para o dia a dia, e aplicar o design thinking para buscar soluções viáveis e acessíveis.
“A morte é abordada na cultura pop e na arte, mas quando um membro da família morre, as pessoas se deparam com questões que elas realmente não entendem. Isso ocorre porque a morte foi varrida de nossas vidas para hospitais e necrotérios. Isso pode soar macabro, mas eu gostaria que a morte e os enterros pudessem ganhar mais espaço na vida cotidiana das pessoas”, contou em entrevista ao
A designer descobriu que, na Finlândia, adultos entre 30 e 40 anos buscam uma mudança nos rituais tradicionais – eles querem tirar proveito da era digital, da inteligência artificial e dos materiais inteligentes para planejar eventos com antecedência, participar de funerais de forma remota, e ter acesso a soluções individuais.
“A compostagem do corpo já é possível em algumas partes do mundo, e no Japão, algumas pessoas atuam como planejadores de casamentos para organizar funerais. Em alguns lugares, a inteligência artificial foi usada para reunir memórias e aliviar as diferentes fases do luto”, disse.
Design para a morte
Nessa linha de pensamento, a revista de design digital
Uma das alternativas ao enterro tradicional é a
Outros tipos de urna buscam trazer conforto aos familiares e amigos por meio de objetos menores, que podem ser tocados e transportados com facilidade. É o caso da
Um enterro mais humano é o que propõe o
“Analisar os pontos fortes e fracos dos atuais sistemas e rituais com a mente aberta e aplicar a graça, a previsão, o rigor, a sensibilidade e a imaginação para vislumbrar melhores resultados poderiam nos ajudar a morrer de forma mais humana”, Alice Rawsthorn, crítica de design, explicou ao
Morte por metro quadrado
Isso também tem a ver com os espaços físicos. A
Alguns memoriais também se destacam no quesito delicadeza. Um deles é o Memorial do 11/9, em Nova York. Ali, as antigas Torres Gêmeas foram substituídas por cascatas infinitas que, nas bordas, contêm os nomes dos que morreram ali. À noite, elas são iluminadas e “reconstroem” os prédios que foram destruídos.
Em Berlim, o Memorial aos Judeus Mortos da Europa usou uma abordagem mais minimalista e clean. Fileiras de blocos cinza de mesmo tamanho (na proporção de um caixão) se repetem e, parecendo intermináveis, criam uma impressão de contínuo.
As Catacumbas de Paris, um dos passeios mais diferentes da cidade francesa, foram criadas para resolver a superpopulação dos cemitérios, que apresentavam um risco para a saúde. Hoje, organizados de forma quase artística, os ossos não permitem discriminação, mas prestam homenagem a esse período da história francesa e aos mais de dois milhões de parisienses enterrados ali.
Lugares e projetos como estes provam que é possível tratar da morte de um forma sutil e, ao mesmo tempo, manter viva a lembrança e a consciência do passado.